segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Salve salve o apagão!

Já se imaginou ficar sem energia elétrica? Impossível, diria. Sim, também não sobrevivo mais sem computador, internet, ar condicionado (ou mesmo o velho ventilador), micro-ondas e por ai vai...
Mas que saudade dos apagões cotidianos. Para os mais jovens é bom explicar que muitas vezes a energia elétrica nos pregava uma peça. Pobre das mães, bem na hora da novela, o único programa que assistiam e que as fazia ficar sentadinhas em frente à televisão caixote. Pois bem, apesar dos reclames, confesso que eu adorava esses momentos de apagão.  Era a hora da família toda se reunir. Na cozinha ou mesmo lá fora, quando era muito quente. E era aquela confusão para achar as velas pela metade. Quem foi que as guardou da última vez? Depois disso aquela distribuição de velas pela mesa da cozinha.  Cuidado para não se queimar. Uma ficava de reserva. Era para quem precisava ir ao banheiro. E o medo de ir sozinha? Ah, a irmã mais velha ia junto, mas sempre para assustar, colocando a vela embaixo do rosto para dar aquela impressão horrenda de “Os outros” ou algo assustador semelhante assim. Na cozinha as mais variadas conversas. Resgate histórico dos momentos secretos de nossos pais na infância e adolescência. Ficávamos sabendo de histórias que só eram mencionadas ali.  Pareciam até pertencer há um momento assim. Que ficava nas entrelinhas e que agora aparecia com aquele ar nostálgico e sombrio (mas tudo isso no seu aspecto positivo). Esta forte ligação deve ser porque trazia sensações diferentes. E se fossemos lá para fora, as histórias eram interrompidas pelas indagações acerca das estrelas e do universo. Era impossível não fazê-las. Hora de deixar os olhos bem abertos para captar cada sinal brilhante daquele céu estrelado.  Ver estrela cadente era raro, mas quem visse ganhava, literalmente, as estrelas! Sensação alguma substitui isto. Mas como meu pai estava contando.... ops a luz voltou. Minha mãe vai correndo ligar a TV, meu pai o rádio e eu ficava ali, esperando por um novo apagão.  Cadê?

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.

A Flor e a Náusea

Preso à minha classe e a algumas roupas,
Vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me'?

Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas,
alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.

Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas,
consideradas sem ênfase.

Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio,
paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horasda tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.


Carlos Drummond de Andrade 

domingo, 8 de janeiro de 2012

"Arco-íris no céu.
Está sorrindo o menino 
que há pouco chorou."
Helena Kolody